TE PROVEI, AGORA TENHO FOME DE TI

  


“ _Ó Deus, tu és o meu Deus forte; eu te busco ansiosamente; a minha alma tem sede de ti; meu corpo te almeja, como terra árida, exausta, sem água. Assim, eu te contemplo no santuário, para ver a tua força e a tua glória. Porque a tua graça é melhor do que a vida; os meus lábios te louvam_” (Salmo 63:1-3).


Tarde Te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova… Tarde Te amei! Trinta anos estive longe de Deus. Mas, durante esse tempo, algo se movia dentro do meu coração…


Eu era inquieto, alguém que buscava a felicidade, buscava algo que não achava… Mas Tu Te compadeceste de mim e tudo mudou, porque Tu me deixaste conhecer-Te. Entrei no meu íntimo sob a Tua Guia e consegui, porque Tu Te fizeste meu auxílio.


(…) Tu me chamaste, clamaste por mim e Teu grito rompeu a minha surdez… “Fizeste-me entrar em mim mesmo… Para não olhar para dentro de mim, eu tinha me escondido. Mas Tu me arrancaste do meu esconderijo e me puseste diante de mim mesmo, a fim de que eu enxergasse o indigno que era, o quão deformado, manchado e sujo eu estava”.


Em meio à luta, recorri a meu grande amigo Alípio e lhe disse: “Os ignorantes nos arrebatam o céu e nós, com toda a nossa ciência, nos debatemos em nossa carne”. Assim me encontrava, chorando desconsolado, enquanto perguntava a mim mesmo quando deixaria de dizer “Amanhã, amanhã”… Foi então que escutei uma voz que vinha da casa vizinha… Uma voz que dizia: “Pega e lê. Pega e lê!”.


Brilhaste, resplandeceste sobre mim e afugentaste a minha cegueira. Então corri à Bíblia, abri-a e li o primeiro capítulo sobre o qual caiu o meu olhar. Pertencia à carta de São Paulo aos Romanos e dizia assim: “ _Não em orgias e bebedeiras, nem na devassidão e libertinagem, nem nas rixas e ciúmes. Mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo_” (Rm 13:13). Aquelas Palavras ressoaram dentro de mim. Pareciam escritas por uma pessoa que me conhecia, que sabia da minha vida.


Exalaste Teu Perfume e respirei. Agora suspiro por Ti, anseio por Ti! Deus… de Quem separar-se é morrer, de Quem aproximar-se é ressuscitar, com Quem habitar é viver. Deus… de Quem fugir é cair, a Quem voltar é levantar-se, em Quem apoiar-se é estar seguro. Deus… a Quem esquecer é perecer, a Quem buscar é renascer, a Quem conhecer é possuir. Foi assim que descobri a Deus e me dei conta de que, no fundo, era a Ele, mesmo sem saber, a Quem buscava ardentemente o meu coração.


Provei-Te, e, agora, tenho fome e sede de Ti. Tocaste-me, e agora ardo por Tua Paz. “Deus começa a habitar em ti quando tu começas a amá-Lo”. Vi dentro de mim a Luz Imutável, Forte e Brilhante! Quem conhece a Verdade conhece esta Luz. Ó Eterna Verdade! Verdadeira Caridade! Tu és o meu Deus! Por Ti suspiro dia e noite desde que Te conheci. E mostraste-me então Quem eras. E irradiaste sobre mim a Tua Força dando-me o Teu Amor!


E agora, Senhor, só amo a Ti! Só sigo a Ti! Só busco a Ti! Só ardo por Ti!…


Tarde te amei! Tarde Te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova! Tarde demais eu Te amei! Eis que estavas dentro, e eu, fora – e fora Te buscava, e me lançava, disforme e nada belo, perante a beleza de tudo e de todos que criaste. Estavas comigo, e eu não estava Contigo… Seguravam-me longe de Ti as coisas que não existiriam senão em Ti. Chamaste, clamaste por mim e rompeste a minha surdez.


Brilhaste, resplandeceste, e a Tua Luz afugentou minha cegueira. Exalaste o Teu Perfume e, respirando-o, suspirei por Ti, Te desejei. Eu Te provei, Te saboreei e, agora, tenho fome e sede de Ti. Tocaste-me e agora ardo em desejos por Tua Paz!



(Extratos selecionados do livro "Confissões, de Agostinho de Hipona" (354-430) - livro X).


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