A Insuficiência do "Cristianismo Instantâneo"

 


Não é de admirar que o país que inventou o chá e o café instantâneos também desse ao mundo o cristianismo instantâneo. Caso essas duas bebidas não tenham sido realmente inventadas nos Estados Unidos, foi certamente aqui que receberam o ímpeto publicitário que as tornou conhecidas na maior parte do mundo civilizado. E não pode ser também 

negado que foi o Fundamentalismo americano que introduziu o cristianismo instantâneo nas igrejas evangélicas.

Se ignorarmos por um momento o romanismo e o liberalismo em seus vários 

disfarces, concentrando nossa atenção sobre o grande número de crentes evangélicos, vemos imediatamente quanto a religião cristã sofreu na casa de seus amigos. 

O gênio americano para a realização fácil e rápida de tudo, sem preocupar-se com a sua qualidade ou permanência, gerou um vírus que veio a contagiar toda a igreja evangélica nos Estados Unidos e, através de nossa literatura, nossos evangelistas e nossos missionários, espalhou-se por todo o mundo.

O cristianismo instantâneo acompanhou a idade da máquina. Os homens inventaram 

as máquinas com duas finalidades. Queriam fazer mais rapidamente o trabalho considerado importante e queriam ao mesmo tempo terminar logo suas tarefas a fim de dedicar-se a coisas mais do seu agrado, tais como o lazer ou gozar dos prazeres mundanos.

O cristianismo instantâneo serve agora aos mesmos propósitos na religião. Ele ignora o passado, garante o futuro e libera o cristão para seguir as inclinações da carne com toda boa consciência e um mínimo de restrição.

Com a expressão "cristianismo instantâneo" estou me referindo ao tipo encontrado quase em toda parte nos círculos evangélicos, nascidos da idéia de que podemos livrar-nos de toda obrigação para com nossas almas através de um só ato de fé, ou no máximo dois, ficando tranqüilos daí por diante quanto à nossa condição espiritual, sendo então permitido inferir que não existe razão para termos um caráter santo. 

Uma qualidade automática, de uma vez por todas, acha-se presente neste conceito, a qual não se adapta de maneira alguma à fé apresentada no Novo Testamento.

Neste erro, como na maioria dos outros, encontra-se uma certa parte de verdade 

imperfeitamente interpretada. É verdade que a conversão a Cristo pode ser, e muitas vezes  repentina. Onde o peso do pecado se revelou grande, o recebimento do perdão é no geral alegre e claro. 

A alegria experimentada no perdão equivale à repugnância moral de que nos despojamos no arrependimento. 

O verdadeiro cristão encontra Deus. Ele sabe que tem a vida eterna e provavelmente sabe onde e quando a recebeu. 

Os que foram também enchidos com o Espírito Santo após a sua regeneração sentem perfeitamente a operação que está sendo realizada neles. 

O Espírito anuncia-se a si próprio, e o coração renovado não tem dificuldade em identificar a sua presença à medida que Ele se derrama na alma.

O problema está em que nos inclinamos a confiar nas nossas experiências e, em 

conseqüência disso, interpretamos erradamente todo o Novo Testamento. Somos constantemente exortados a tomar a decisão, a resolver o assunto imediatamente e, os que nos aconselham nesse sentido estão certos. Existem decisões que podem e devem ser 

tomadas de uma vez por todas. Certos assuntos pessoais podem ser decididos 

instantaneamente mediante um ato determinado da vontade em resposta a uma fé bíblica. 

Ninguém iria negar tal coisa, e eu certamente não farei isso.

A questão que nos enfrenta é esta: O que pode ser realizado através desse ato único de fé? Quanto falta ainda a ser feito e até que ponto uma única decisão pode levar-nos?

O cristianismo instantâneo tende a considerar o ato de fé como um fim em si mesmo e sufoca o desejo de crescimento espiritual. Ele não compreende a verdadeira natureza da vida cristã, que não é estática mas dinâmica e expansionista. Ele passa por cima do fato de o novo cristão representar um organismo vivo, como um bebê recém-nascido, necessitado de nutrição e exercício a fim de assegurar o seu crescimento normal. Ele não considera que o ato de fé em Cristo estabelece um relacionamento pessoal entre dois seres morais 

inteligentes, Deus e o homem reconciliado, e um encontro único entre Deus e uma criatura feita à sua imagem jamais poderia bastar para estabelecer uma amizade íntima entre ambos.

A tentativa de englobar toda a salvação numa só experiência, ou talvez duas, por parte dos defensores do cristianismo instantâneo, zomba da lei do desenvolvimento que abrange toda a natureza. 

Eles ignoram os efeitos santificadores do sofrimento, do carregar da cruz 

e da obediência prática. Olvidam também a necessidade de treinamento espiritual, de formar hábitos religiosos corretos e de lutar contra o mundo, o diabo e a carne.

A preocupação excessiva com o ato inicial da crença fez nascer em alguns uma 

psicologia de acomodação, ou pelo menos de não-expectativa. Para alguns o resultado foi uma decepção com a fé cristã. Deus parece demasiado distante, o mundo próximo demais, e a carne muito poderosa e irresistível. Outros ficam satisfeitos em aceitar a segurança da 

bênção automática. Ela os livra da necessidade de vigiar, lutar e orar, e os considera liberados para gozar deste mundo enquanto aguardam o outro.

O cristianismo instantâneo é a ortodoxia do século vinte. 

Imagino se o homem que escreveu Filipenses 3:7-16 o reconheceria como a fé pela qual morreu. Temo que não. 


A.W.Tozer


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