A natureza da obra sacerdotal, o amor revelado em Cristo e a advertência à Igreja de Éfeso
A natureza da obra sacerdotal, o amor revelado em Cristo e a advertência à Igreja de Éfeso (AP 2).
O Sacerdócio do Antigo Testamento: uma obra objetiva
Os sacerdotes do Antigo Testamento, especialmente os da linhagem de Arão, tinham a função de interceder pelo povo diante de Deus por meio de sacrifícios, conforme a Lei mosaica. Esta obra era objetiva, era baseada em prescrições externas, rituais, regras e símbolos que apontavam para realidades espirituais futuras (Hebreus 10:1).
O sacerdote era escolhido por Deus, mas não necessariamente movido por um amor pessoal profundo pelo povo; ele era apenas um mediador ritual, e sua obra era limitada (Hebreus 5:1-4).
Os sacrifícios tinham que ser repetidos continuamente, pois não podiam remover os pecados definitivamente (Hebreus 10:4).
Não havia, portanto, uma expressão subjetiva de amor por parte do sacerdote. Ele agia por dever, não por uma união interior com o povo ou uma compaixão transformadora.
Cristo como O Sumo Sacerdote do Novo Testamento e a plenitude do amor, não apenas realiza a obra sacerdotal perfeita, mas encarna o amor de Deus de forma objetiva e subjetiva.
Ele oferece a si mesmo como o Cordeiro perfeito, único sacrifício eficaz e eterno (Hebreus 9:12). Ele ama o povo com amor pessoal e sacrificial (João 13:1, Gálatas 2:20). Cristo sofre com o povo, se compadece, e se entrega por amor. Ele vive para interceder continuamente por nós (Hebreus 7:25), como Sumo Sacerdote que sente as nossas dores (Hebreus 4:15).
A obra de Cristo é completa, porque une a justiça objetiva de Deus com o amor subjetivo do Filho.
A Igreja de Éfeso e o abandono do primeiro amor:
No contexto de Apocalipse 2, Cristo aparece como o Sumo Sacerdote celestial, "aquele que anda entre os sete candelabros de ouro" (Ap 2:1), ou seja, entre as igrejas. Isso remete à imagem do sacerdote cuidando dos candelabros no Tabernáculo (Êxodo 27:20-21), mostrando que Cristo é aquele que preserva a luz da igreja, vela por ela, limpa, disciplina e exorta.
Cristo elogia a igreja de Éfeso por suas obras, perseverança e discernimento doutrinário, mas adverte: "Tenho, porém, contra ti que abandonaste o teu primeiro amor" (Ap 2:4). Essa exortação é profundamente conectada à crítica feita aos sacerdotes no Antigo Testamento e à obra sem amor subjetivo. Éfeso representa uma igreja que realiza obras objetivas (boas doutrinas, correção de falsos mestres), mas sem o amor interior, sem a motivação do amor por Cristo e pelo próximo.
O culto racional e agradável (Romanos 12:1-2) exige não apenas o agir correto, mas o coração correto.
O abandono do “primeiro amor” é o abandono da motivação amorosa e relacional que deve permear o serviço cristão, exatamente o que distinguia Cristo dos sacerdotes do Antigo Testamento.
A comparação entre o sacerdote do Antigo Testamento, Cristo como Sumo Sacerdote e a Igreja de Éfeso nos revela uma linha teológica clara.
Portanto, a Igreja é chamada a refletir Cristo, e não os sacerdotes do Antigo Testamento. A advertência à Éfeso é um chamado para que a Igreja una a verdade doutrinária à motivação amorosa, para que suas obras sejam não apenas corretas, mas também nascidas do “primeiro amor”.
Essa conexão entre o amor perdido (Ap 2), o culto racional (Rm 12:1) e o sacerdócio de Cristo (Hb 4–10) nos revela a essência da vida cristã verdadeira: uma fé viva, amorosa e sacerdotal, centrada em Cristo.
O “primeiro amor” e o culto racional (Rm 12:1) nos exorta:
Aqui, Paulo fala de um culto racional que é Intencional (não mecânico), voluntário (não forçado) e pessoal (não ritualístico),
Baseado no amor e gratidão pela misericórdia de Deus, o “primeiro amor” de Éfeso está intimamente ligado a esse culto. O amor inicial é aquele fervor cheio de gratidão e entrega total que leva o crente a oferecer-se como sacrifício vivo, de coração. Quando esse amor esfria, o culto pode continuar externamente, com doutrina correta, disciplina e boa aparência, mas perde o seu caráter racional e vivo, tornando-se apenas formalidade.
Perder o amor é perder a motivação verdadeira do culto. Sem amor, a oferta não é mais viva, santa nem agradável. Vira rotina. E isso é o que Jesus confronta em Éfeso.
O sacerdócio de Cristo é a perfeição do culto racional. Cristo é o modelo do culto racional perfeito, porque
Ele ofereceu a si mesmo como sacrifício vivo (Ef 5:2, Hb 9:14). Ele fez isso por amor ao Pai (Jo 14:31) e por amor aos homens (Jo 15:13).
Ele ofereceu um culto voluntário, santo, consciente e definitivo, não apenas obedecendo a rituais, mas oferecendo sua própria vida com plena consciência e entrega.
Portanto, Cristo não só é o Sumo Sacerdote, mas também o sacrifício perfeito e o ofertante perfeito. Ele é o cumprimento do culto racional, um Ato de amor que agrada ao Pai e salva os homens.
A ligação dos três elementos: o Amor, o Culto e o Sacerdócio.
A igreja como sacerdócio real, como Pedro declara, deve seguir o modelo de Cristo, não dos sacerdotes ritualísticos. Deve viver um culto diário, uma vida consagrada por amor.
Deve manter o primeiro amor, pois dele brotam os sacrifícios espirituais: oração, louvor, serviço, obediência, intercessão.
Quando o amor se perde, o culto racional se apaga. Quando o amor é reacendido, o culto se torna vivo novamente e a Igreja cumpre seu papel sacerdotal no mundo.
Ainda há uma promessa profundamente rica e simbólica, aquela feita por Cristo à Igreja de Éfeso: comer da árvore da vida.
Essa promessa conecta diretamente o arrependimento e o retorno ao primeiro amor com a restauração da comunhão plena com Deus, representada pela árvore da vida.
A Árvore da Vida, símbolo da comunhão íntima e vida eterna. Em Gênesis 2–3, a árvore da vida estava no centro do Jardim do Éden. Adão e Eva tinham acesso a ela enquanto estavam em plena comunhão com Deus.
Após o pecado, foram expulsos do jardim e impedidos de comer da árvore da vida (Gn 3:24), como um sinal de que perderam a comunhão e a vida eterna por causa da desobediência.
A árvore da vida, portanto, simboliza a presença de Deus, a comunhão perfeita com Ele, a vida eterna como dádiva do relacionamento com Deus.
A promessa em Apocalipse 2 de restauração da comunhão em Cristo promete que àquele que vencer, ou seja, aquele que se arrepender e retornar ao primeiro amor, Ele concederá o direito de comer da árvore da vida.
Isso significa restaurar o que Adão perdeu, a comunhão íntima com Deus. Entrar novamente no Paraíso, não o físico, mas o espiritual e eterno. Participar da plenitude da vida em Deus, não apenas no futuro, mas já em parte no presente, por meio da presença do Espírito e do culto verdadeiro.
Portanto, há também uma ligação com o culto racional e o sacerdócio. Essa promessa está profundamente conectada ao culto racional e ao sacerdócio espiritual.
O arrependimento leva ao retorno do amor original. O amor reacende o culto racional, uma vida entregue a Deus. Essa vida entregue gera comunhão verdadeira, um sacerdócio vivo.
A comunhão restaurada com Deus é representada pela árvore da vida. Portanto, comer da árvore da vida é o clímax de uma caminhada que começa com o amor e se expressa em uma vida de culto, serviço e adoração, como um sacerdote espiritual, à semelhança de Cristo.
Hoje, já podemos provar dessa comunhão por meio do Espírito, da Palavra, da oração e do culto verdadeiro.
Na eternidade, comeremos plenamente da árvore da vida, isto é, entraremos em comunhão irreversível com Deus na Nova Jerusalém (Apocalipse 22:1-2).
A promessa da árvore da vida é o convite ao retorno ao Éden espiritual, não por nossos méritos, mas por meio de Cristo, nosso Sumo Sacerdote, que reabre o caminho para a comunhão com o Pai.
O que Éfeso precisava era retornar ao primeiro amor para que o culto fosse apropriado e, por consequência, houvesse realidade.
Cristo se apresenta como o Sacerdote, aquele capaz, o único capaz, de restaurar o amor, gerar o culto apropriado e, assim, poder conduzir Éfeso a Árvore da Vida ( a verdadeira comunhão que é no Pai e no seu Filho)
(Irmão Marco Bruno)
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